O Importante é Viajar!
Quando eu comecei a ir a festas, em 2000, lembro-me bem de chegar às festas sempre por volta das 4h00 da manhã ou 5h00. Na altura não apreciava muito os sons da noite e todo o seu magnetismo envolvido. Éramos claramente uns habitués que procurávamos sons mais alegres e mais melódicos, mais expansivos. Em pouco tempo, nos anos que se seguiram, até 2004, começou-se a ouvir uma produção em massa que nos chegava mais de Isarel, e nomes como Skazi e Astrix surgiram, acentuando o género que hoje todos conhecemos como Full ON, e a pouco e pouco deixámos de ter a variedade de vertentes do Goa Trance como o Dark por exemplo, que passou a fazer parte de uma cultura mais undergroung. Lembro-me também que não éramos os únicos a ir às festas só ao amanhecer, como havia muitos outros que preferiam estar na noite e de manhã iam se embora.
Foram poucos os anos submersos no Full On, mas o suficiente para despoletar nos artistas dos outros géneros de trance psicadélico uma necessidade de movimento quase como contra cultura face aquilo tudo que estávamos a viver no momento em 2000/2003. O resultado foi que noutras vertentes como o Dark, Hightech, o Forest, o Progressivo, Goa Trance foram surgindo respostas alternativas à massificação se vivia no momento no Mundo do Trance Psicadélico. O mestre Goa Gil mas também Psykovsky, Tim Schuldt, Xenomorph e Ocelot, foram alguns dos pioneiros cavaleiros do apocalipse que se dedicaram à produção do trance mais sombrio em tempos em que o Full On era Rei, e troxeram novas sonoridades com viagens mais emerssivas, mais introspectivas, baixos pesados e vibrantes.
Atualmente temos Trance Psicadélico para todos os gostos ou não vivessemos nós numa era de Globalização e Mundialização das Culturas, temos rótulos para tudo, que vão desde do Full ON (Xálalá) ao Hightech, há cada vez mais festas de contexto, ou seja Festas só de Progressivo, só de Dark e Forest, ou só de Goa. Perdendo-se no tempo, o antigo Protocolo ensinado pelo mestre Goa Gil, em que numa festa temos que ter um pouco de tudo, em que à noite temos o apocalipse e de dia vem a alegria, a melodia e a esperança.
Festivais como o Modem ou o Master of Puppets veem comprovar que é possível fazer um evento com o mesmo registo musical durante vários dias. Mas não serão as viagens todas iguais? Ou muito parecidas? Se o público gosta e sabe ao que vai, então tá tudo certo.
A viagem! A entrega à música! Acho que no final das contas isso é o que mais importa. A música pode ser mais melódica, alegre, social ou pode ser mais sombria, emerssiva, introspectiva, com baixos pesados e vibrantes. Podemos estar mais abertos ao convívio e à partilha com os outros, ou podemos querer viajar sozinhos, pensar na vida, limpar a alma, curtindo a música sem interargir mas com um sorriso nos lábios. O mais importante mesmo é viajar. E mais importante é haver oferta no panorama dos eventos para que todos possamos escolher como cidadãos bem informados neste Mundo Global como e quando queremos viajar, o que vamos ouvir, e quem é que nos vai a companhar.
Vivemos neste momento tempos muitos difíceis, não é facil falar em Festas e Festivais quando sabemos que o futuro está cheio de pontos de interrogação,e que o mais certo é que pensando na prevenção, os eventos, concertos e concentrações de pessoas deverão ser evitados. Temos que arranjar alternativas para as nossas viagens, é tempo de explorarmos mais o Mundo Digital, de nos dedicarmos à pesquisa dos trabalhos de artistas que nós gostamos, apoiarmos esses artistas, partilharmos com os outros esse conhecimento. Reuniões via Skype, vídeos com Djs Sets, rankings com os melhores da semana. A nossa imaginação está livre para criarmos novas realidades para os desafios que temos agora. Façam boas viagens não importa onde estejam.
Texto de Manoella Cortez
Foto de Baptista Photography